De visita a Natal
- Beto Scandiuzzi
- 18 de jun. de 2021
- 2 min de leitura
A cidade de Natal, todo mundo sabe, fica lá na esquina norte do Brasil, aonde o vento chega e faz manobra. Quem nasce lá é natalense, mas quem nasce no estado, Rio Grande do Norte, é potiguar, em homenagem aos índios Tupis que viviam ali ainda nos tempos do descobrimento, quando portugueses e holandeses brigavam pelo poder de colonizar estas novas terras da América. Como essas tribos viviam de comer camarão, abundantes naqueles mares, ficaram conhecidos como potiguares, que na linguagem deles significa: comedor de camarão.
Natal é, segundo a propagada, a cidade do sol. Faz sol o ano inteiro e inverno ninguém nunca ouviu falar. A temperatura oscila entre 20 e 30 graus, mas o clima é agradável, suavizado pelos ventos frescos que chegam do mar e sopram o ano inteiro. Às vezes você olha para o céu e vê umas nuvenzinhas um pouco escuras, preguiçosas, se movendo como quem não tem pressa de chegar. Como bom paulista, logo penso: vai chover.
“Chove não”, que é como eles falam quando perguntados, afirmando e logo desmentindo.
E à noite eu ficava olhando a lua, redonda, cheia, brincando de esconde-esconde com essas nuvens viajantes que andam para lá e para cá enganando paulista. E um dia choveu, mas o sol que estava não se foi, e foi um sol e chuva, casamento de viúva, como cantava minha mãe quando eu era moleque. Uma chuvinha leve, curta, doce, rala como sopa de pobre. Sem raios nem trovões, dispensáveis quando chove por lá.
Passando por pequenos povoados a caminho das praias paradisíacas, notei que várias casas, simples, baixas, tão baixas que pareciam agachadas, telhados tipo meia-água, tinham grades de ferro nas janelas e portas. Pensei, até aqui tem ladrão?
– Tem não – responde o guia. – As gradinhas aqui são enfeites e sinal de prosperidade. Todo pobre quer ter uma, significa que melhorou de vida.
Câmara Cascudo, amigo de Carlos Drummond, Manuel Bandeira, é o mais ilustre escritor potiguar. Autor de mais de 150 livros, alguns deles, dizem, até ele desconhecia. Fui a uma livraria comprar um. O moço me olhou espantado enquanto consultava o computador. Ao cabo de alguns segundos me disse:
– Tem não.
A música que rola lá é o forró, imortalizado por Luiz Gonzaga. E principalmente o forró pé de serra, que se faz com a sanfona de oito baixos, a zabumba e o triângulo. Alguns dizem que a palavra forró vem da época em que os americanos viveram por lá na Segunda Guerra Mundial, e de lá partiam para bombardear os alemães no norte da África. Nas folgas eles organizavam as festas e diziam: for all, para todos. Os nativos não entendiam inglês e o for all ficou forró.
Ao lado do hotel, todas as noites, havia forró, que se dança na ponta dos pés, um passo pra frente, outro pra trás, num rodado constante e bem agarradinhos, testa a testa, com muita sensualidade. As músicas são alegres, e com alguma malícia, como a que diz assim:
“Mas o senhor não tem respeito,
É um homem mal educado,
Sabe que não é direito,
O senhor tá dançando armado, o senhor tá dançando armado,
Nós vamos dizer pro delegado;”
Janeiro, 2015
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