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Ah, essa paixão juvenil

  • Foto do escritor: Beto Scandiuzzi
    Beto Scandiuzzi
  • 4 de dez. de 2019
  • 2 min de leitura

Passeio pela cidade, sem pressa, sem destino num lindo dia de céu azul cristalino, sol amarelo brilhante, um desses dias preguiçosos que se arrastam pela sombra e não terminam nunca. Pelo colorido dos flamboyants e dos cachos amarelos perfumados da acácia, poderia jurar que é novembro. É feriado e a cidade está vazia, quase abandonada. É assim por todo lado onde passo, até parece que os cachorros também se foram de férias, não se vê nenhum deles, remexendo latas, apostando corrida com os carros.

Num sinal de trânsito, paro. É um desses sinais longos, que se pega no início do amarelo, vai lentamente, entra pelo vermelho afora. Sem nenhuma pressa. Distraído, olho para os lados, esquerda, direita. E me surpreendo. Num ponto de ônibus sob um jacarandá florido, um casalzinho de jovens. Olho bem. Ele, duro, tenso, sério, cara de mau, olhar perdido. Ela, cara de anjo, o olha com aquele olhar de serpente, enviesado, envenenado, de baixo para cima, da esquerda para a direita. Não posso escutá-la, mas sei que está falando baixinho, em sussurros, cortando as palavras, uma a uma, e soprando-as para fora no rosto dele. Alento puro de paixão. Ao mesmo tempo sua mão direita acaricia a cintura dele, enquanto a esquerda, num sincronismo perfeito, avança suavemente, lentamente, tocando o peito, abrindo os botões da camisa, caçando e puxando pelinhos. Um a um.

Entretenho-me e nem percebo o sinal abrir. Um motorista de atrás me toca buzina. Saio devagarzinho ainda a tempo de ver a cara dele ainda fechada e mal-humorada. Faço uma volta no quarteirão, levo menos de cinco minutos e paro no mesmo sinal. Busco o casalzinho de jovens e o que vejo? Vejo-os enlaçados, enroscados em beijos e abraços. Que havia passado com ele? Ah, havia perdido a pose e sucumbido as carícias provocantes dela. O amor nessa idade é assim, vai de um extremo a outro num piscar de olhos. Como vida e morte, paz e loucura, rios de correnteza e mares sem onda.

Novembro, 2019

 
 
 

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