Canillita
- Beto Scandiuzzi
- 6 de dez. de 2018
- 2 min de leitura
Sempre que passo por Rosário, Argentina, tenho o costume de ir à tardezinha a uma cafeteria perto do hotel para o meu último “cortado” do dia (café com uma gotinha de leite). E aproveito para ler o jornal. É comum cada cafeteria, restaurante, bar, ter sempre dois ou três jornais para o público ler. Nesta semana, quando fui à cafeteria de sempre e procurei o jornal não o encontrei. O atendente que já me conhece de outras viagens, logo veio em meu socorro e disse:
– Hoje não tem jornal, dia do “canillita”.
“Canillita”, que em espanhol significa canela fina, é o entregador diário do jornal e revistas aos assinantes a domicilio, ou o que o vende nas esquinas mais movimentadas da cidade alardeando as principais manchetes do dia. Considera-se que o nome se deve a uma obra teatral escrita pelo uruguaio Florencio Sánchez no inicio do século XX, que se inspirou nas pernas finas e magras de um garoto que trabalhava entregando jornais na rua para ganhar algumas moedas. Era tal a pobreza do garoto que ele usava uma calça velha que se foi encurtando à medida que ele crescia e deixando à mostra suas canelas finas. O sucesso da obra foi total tanto no Uruguai como na Argentina e até no Chile. O escritor uruguaio morreu na França num 7 de novembro com apenas 35 anos. Desde então, nesta data e em toda Argentina, em sua homenagem e aos entregadores de jornais, se comemora o dia do “canillita”.
Dizem que com frio, sol, chuva, não importa, o “canillita” não falha nunca, recorrendo solitário e silenciosamente as ruas e avenidas ou despertando a vizinhanca com seu grito de guerra inconfundível: diario, diario. Somam uns 5000 em toda Argentina.
Nos anos 90, quando vivi em Buenos aires, me impressionavam os “paseaperros”, que eu via por primeira vez, uns sujeitos que todas as manhãs buscam os cachorros nas casas e apartamentos para levá-los a passear nos parques e praças. Dez, quinze, vinte cachorros de todas as raças, tamanhos e brabezas ordenados e tranquilos sob a batuta do passeador de cachorros que mais se parece um encantador de serpentes.
Empanadas, “alfajores”, “canillitas”, “paseaperros”, “medialunas”, “achuras”, “cortado”, “bife de chorizo”, tango, “pasion”, “besos”, são parte da cultura do país de “los hermanos” que todos os brasileiros adoram visitar. Tão próximo, às vezes parecido, às vezes tão diferente de nós.
Novembro, 2018
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