Feliz 1969 O ano que não devia acabar
- Beto Scandiuzzi
- 6 de dez. de 2018
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O ano de 1969 havia se iniciado ainda com a ditadura militar sob a batuta do general Costa e Silva (doente, ele deixaria a presidência em agosto daquele ano), a repressão corria solta, o congresso nacional seguia fechado, mas nada disso me importava. Eu tinha 19 anos, uma namorada, jogava futebol quase todos os dias, havia sido aprovado na faculdade de engenharia, fazia novos amigos, conhecia uma nova cidade, uma nova vida. Era feliz!
O primeiro semestre passou voando e em setembro, logo na primeira semana, a faculdade organizou uma viagem a Belo Horizonte para uma visita à Refinaria Gabriel Passos, também conhecida por REGAP (havia sido inaugurada no ano anterior), no ônibus da escola com o Etelvino ao volante. Naquela época, o Triângulo Mineiro não se comunicava diretamente com a capital Belo Horizonte por via térrea. Talvez, como castigo por seus anseios separatistas manifestados no passado. Assim, para chegar a Belo Horizonte havia que ir a Ribeirão Preto, subir pelo sul de Minas, com estradas de pista simples e muitas horas de viagem. Viajamos o dia todo e já era noite alta quando chegamos ao trecho mais perigoso da estrada, curvas, subidas, descidas, montanhas e precipícios ao costado da rodovia. O Etelvino, cansado, acho que cochilou, e o ônibus bateu contra o costado de uma montanha depois de trafegar pelo acostamento umas centenas de metros ao lado de um precipício. Escapamos todos, por pouco.
Era parte do programa assistir, pelo menos para mim, a um jogo amistoso da seleção brasileira do João Saldanha contra o Galo do Yustrich no Mineirão, inaugurado poucos anos antes. O Brasil, que seria campeão mundial no México no ano seguinte, perdeu, mas a imagem do Pelé fazendo o gol de cabeça nunca me saiu da memória.
A visita à REGAP durou todo um dia, mas eu não me lembro de nada, nem de uma pequena parte do processo do refino do petróleo que ela fazia, antecipando o pouco gosto que eu tinha pela engenharia mecânica e que iria se manifestar na minha vida profissional anos mais tarde.
Em Belo Horizonte fiquei hospedado numa república de amigos dos meus amigos. À tardezinha, eles se revezavam para ver a empregada, por sinal muito bonita, tomar banho através de um buraquinho que eles haviam feito estrategicamente na porta do banheiro da casa. Técnica que eu copiei e levei para minha república quando voltamos para Uberlândia. Para deleite dos meus amigos.
Da viagem, além do gol do Pelé, me ficaram algumas poucas lembranças, a praça Sete com seu pequeno obelisco no centro, a noite escura e silenciosa com o ônibus acidentado na estrada e os meus amigos em volta, a igreja de São Francisco de Assis, de Niemayer. E de vez em quando também passeia pelas gavetas desordenadas da minha memória uma moça linda, sem nome, tomando banho vista por um buraquinho minúsculo na porta.
Novembro, 2018
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